segunda-feira, 20 de abril de 2009

Absurdos....

Não acredito que um homem possa viver sem jamais sentir o absurdo de estar vivo. Ele pode não se dar conta disso, mas o revela através das artes, das suas ações e da ganância por páginas e mais páginas de conhecimentos. Mas é absurdo se isso for visto como uma verdade.
Ainda, absurdo seria querer definir o absurdo. Camus tenta, mas não se pode dizer que ele o define pois antes se preocupa com as consequências do absurdo. É possível dizer sobre o absurdo mas impossível apreendê-lo em uma categoria. Sentimentos profundos das quais as palavras não conseguem dizer, a consciência sempre deixa de dizer algo sobre, diz o autor dando-nos pistas sobre esse sentimento. Tal como um vento repentino, o sentimento do absurdo pode bater no rosto de um homem em qualquer lugar, em qualquer situação: esse sentimento é inapreensível, diz Camus que diante da dificuldade de apreender o absurdo senão pelo indizível do sentimento, se envereda pelas reflexões sobre as duas faces do absurdo: o suicídio ou a reconciliação.
Mas Camus não foi o único a tratar de tal sentimento. O “absurdo” de Nietzsche se revelou num modo de apreensão do devir onde a vida se torna possível com toda sua beleza: o eterno retorno - daí a dificuldade que os exegetas encontram em definir o que é isso, pois se trata de um sentimento do qual as palavras ficam emudecidas. Pode-se dizer que o filósofo também encontrou esse sentimento diante da linguagem, pois ela por si só já é caduca.
Heidegger também encontrou o “absurdo”. A filosofia para ele deveria ser capaz de fazer o homem sentir o horror de existir: o absurdo de existir. O ser que se lança no tempo e que nunca é se depara com o nada e encontra a angústia, mas para Heidegger esta revelação reconcilia o homem com a vida, este reconhece os seus potenciais quando encontra a finitude.
Sartre chamou o “absurdo” de náusea. A angústia que nos invade repentinamente não se trata de um sintoma que os médicos, os psicanalistas e os psicólogos possam resolver. Assim como Heidegger, o homem jamais pode ser senão o não-ser, não sendo nunca está diante da possibilidade de se encontrar com o nada e ser tomado pela angústia, assim sentimos a náusea de estar vivo diante do mundo. Estar vivo pode causar náuseas.
Camus nos dá vários exemplos onde o absurdo pode se revelar. “Cenários desabarem é coisa que acontece. Acordar, bonde, quatro horas no escritório ou na fábrica, almoço, bonde, quatro horas de trabalho, jantar, sono e segunda terça quarta quinta sexta e sábado no mesmo ritmo, um percurso que transcorre sem problemas a maior parte do tempo.” (O Mito de Sísifo). Nesse aparente cotidiano perfeitamente cabível na vida de qualquer homem, é um dos muitos possíveis cenários para o absurdo nos pegar.
O absurdo pode se revelar no amor. No rosto da amada que paralisamos em alguma perspectiva e percebemos quão horrorosa é aquela carne macia que almejamos devorar. Mas o rosto da amada também pode se revelar na coisa mais bela que já nos revelou, nem por isso o absurdo não se revela.
Um olhar paralisante sobre qualquer lugar com seus transeuntes indo e vindo, rostos diferentes, ações diferentes, o que cada bípede daquele pensa? Homens e mulheres buscando suas diferenças podem ser nada mais do que uma massa só, todos iguais, pálidos, inocentes sendo lentamente esfaqueados pela morte: absurdo!
E o que dizer de todo nosso esforço na busca pelo conhecimento, vários sempre achando que irão desvelar o mundo, os seres, o homem e a vida: absurdo!
Mas podemos nos esconder nas trincheiras feitas com livros e artigos científicos. Em um casamento com filhos e uma atmosfera de ideais. Na religião com seus exércitos de personagens do outro mundo. Há várias formas de se dizer que somos normais. Há várias formas de negar o absurdo.
Mas será que se pode dizer que nenhum homem jamais foi visitado pelo horror de existir? Que ninguém já deitou e foi abraçado pelo vazio recebendo um beijo sufocante da angústia? Que ninguém já explodiu de prazer simplesmente por viver sabendo que irá morrer ou simplesmente por estar vivo?
Em toda beleza podemos encontrar o horror, e em todo horror a beleza. Em qualquer lugar podemos encontrar o absurdo. Mas este não é natureza, não é essência, não existe. Como pode então surgir o absurdo do absurdo? Mas ele nasce, é certo, do confronto dos clamores do homem com o indizível do mundo.
Se for possível viver uma vida inteira, um absurdo inteiro sem sentir o absurdo, eu é que não gostaria de ser esse absurdo.




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