quarta-feira, 26 de junho de 2013

Lacan

Quem busca a "verdade" corre o risco de encontrá-la....

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"Quem busca a Verdade corre o risco de encontrá-La".

Isso me faz refletir sobre o canto dessa sereia, pretensiosa, sedutora, arrogante, sádica, embriagadora, travestida de pretensa lucidez, com véus de consciência, inebriando-nos com pretensas flutuantes verdades, levando-nos à loucura do acreditar que podemos ter certezas baseadas em tantas impermanências. "Eu", "Gildo", permaneço em "meu" fluir... Somente o inesperado pode dar Luz à Vida, fazê-la respirar, surpreenda-me, permitindo assim espasmos de existir....

Gildo Fonseca.

segunda-feira, 24 de junho de 2013

O Universo é uma Harmonia dos Contrários. Pitágoras



Todo o sistema binário, eu e o outro, dentro e fora, luz e sombras, todas as matizes que estão contidas no flexível e amplo espectro de todos os contrários, são espelhos, onde percebemos nossas faces e antefaces frente a cada experiência em que a vida se nos manifesta e nos informa assim, que estamos, naquele instante de Percepção, Vivos !!!

Nossa Identidade é a Energia que, movendo o pêndulo que somos e em que estamos, cria o Caminho para conhecermos a nós mesmos através desse mosaico de contrastes onde fluímos pelo Movimento na Dança do Existir, no compasso da Vontade, nos gritos da Alma.

Gildo Fonseca



terça-feira, 18 de junho de 2013

TUDO É VIDA... COM INTENSIDADE !!!!!

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Alguns amigos tem me cobrado um posicionamento quanto às recentes manifestações então, a pedidos, rsrsrs, aqui vai:

Os atuais confrontos tem cinco componentes:

1. A extrema esquerda que acredita que pode haver uma revolução popular a partir da insatisfação da população com a situação social, econômica e política.

2. A extrema direita que infiltrada nos movimentos reivindicatórios de alguns grupos, aproveita a situação para radicalizar e gerar violência nos confrontos. A imagem de um possível skinhead mascarado jogando um foguete contra a polícia e divulgado pelas imagens da imprensa é fato inegável disso.

3. O oportunismo de algumas lideranças de movimentos estudantis e populares que no fundo estão interessados apenas em se elegerem nas próximas eleições.

4. A população, através das pessoas que passam nos locais durante as manifestações e acabam se envolvendo emocionalmente e como uma catarse de inúmeras situações de desconforto econômico aliado a frustrações represadas, desanuviam todas as mágoas da vida não ser como elas querem extravasando sua ira, revolta e indignação no movimento.

5. Os burocratas que estão nas diversas instâncias do poder, preocupados somente com a conservação do seu poder político, tentando contornar a situação e não sairem com a imagem arranhada da situação.

Do embate e do jogo entre essas forças é que se dá o panorama das atuais manifestações. Cada pessoa, dependendo de em qual grupo esteja no momento sintonizado vai defender apaixonadamente uma posição e tentar usá-la para justificar seu posicionamento nessa frente de combate.

Mas ficam algumas perguntas:

- carregar vinagre numa bolsa para não ser obrigado a sofrer com gás lacrimogêneo é crime? Onde podemos encontrar isso na constituição?
- a prisão imediata de 230 pessoas e o envio de 4 delas imediatamente para o presídio de Tremembé no interior do estado de SP, quando, essa mesma rapidez não é usada para a prisão de assaltantes que atacam a população, é correta?

As manifestações, orquestradas em todo o país, pela extrema esquerda e pela extrema direita e com a participação apaixonada da população envolvida e junto com a falta de sensibilidade e percepção dos governantes pode levar, sem dúvida, como um rastilho de pólvora, a um incêndio definitivo das instituições democráticas já tão carcomidas pela podridão interesseira de políticos corruptos, individualistas e insensíveis às necessidades básicas e imediatas do nosso povo.

É claro que existem várias outras nuances e elementos a serem analisadas, mas precisaríamos de muito espaço para a discussão.

Nesse quadro, cada um vai encontrar a válvula de escape para um posicionamento, um meio para desanuviar de suas paixões reprimidas e para a catarse de seus específicos desafios materiais e psicológicos. Como dizia Nietzsche "quem tem um porquê aceita quase qualquer como". O importante é viver intensamente.


Gildo Fonseca


Catarse de um povo

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Catarse (do grego Κάθαρσις "kátharsis") é uma palavra utilizada em diversos contextos, como a tragédia, a medicina ou a psicanálise, que significa "purificação", "evacuação" ou "purgação". Segundo Aristóteles a catarse refere-se à purificação das almas por meio de uma descarga emocional provocada por um drama.
Segundo o filósofo, para suscitar a catarse era preciso que 'o herói recolhesse frutos do pátio da escola'e levasse para casa a fim de comer junto com os outros heróis. 
Sob a ótica da psicologia, catarse é o experimentar da liberdade em relação a alguma situação opressora, tanto as psicológicas quanto as cotidianas, através de uma resolução que se apresente de forma eficaz o suficiente para que tal ocorra.
Por ser um conceito relativo, é difícil estabelecer uma média de frequência de processos catárticos. Por exemplo, há relatos de pessoas que, após andarem sobre brasas afirmam ter experimentado uma liberdade e confiança em termos catárticos. Entretanto, após algum tempo, quando todos os processos hormonais envolvidos nessa sensação se normalizam, estas pessoas se vêem diante da mesma situação anterior à tal experiência.
Para que uma pessoa experimente catarse em relação a um conflito é necessário que uma oportunidade de resolução apresente-se, a "disponibilidade" da pessoa em aceitar tal resolução esteja compatível com a possibilidade de tal resolução se transformar em catarse, a qualidade de tal resolução ser suficiente diante da opressão que a pessoa sente, e outros fatores pessoais, culturais e ambientais (ou seja, se é possível, dentro da realidade que circunda a vida da pessoa, de se manter a resolução).
(o texto acima foi extraído da wikipedia)
Nessa grande catarse coletiva que o Brasil passa hoje cabe pensar, estamos preparados para entender o conjunto de fatores que afeta a todos e a cada um de nós individualmente?
temos uma alternativa segura para preencher o vazio de uma eventual purgação dessa praga chamada corrupção, egoísmo e insensibilidade social que conduz o país através de seus governantes?
depois da repetição de tantas experiências, ao longo de décadas, em que só mudam os personagens políticos enquanto o caráter, que deveria ser o eixo político de todo governante, é deixado de lado, em função de interesses pessoais ou, na melhor das hipóteses, é negociado com pretensos aliados que só querem resolver seus problemas pessoais, quem ou o quê, vamos colocar no lugar como alternativa?
A dura verdade é que manifesta-se a catarse de um povo onde é purgada a náusea do desamparo social, uma revolta contida e que agora explode pela falta de um horizonte ético, amoroso e fraterno, naufragado em negociatas de bastidores onde o respeito pelos direitos do semelhante é simplesmente massacrado.
O grande desafio é, quando se faz uma catarse e a purgação é bem feita, fica um vazio no lugar.
Existem alternativas para realizar o sonho de um povo?
ou mais uma vez, como tantas repetidas vezes, sucede-se a ascensão de oportunistas de plantão, que, canalizando o descontentamento popular, assumem o papel de heróis de um povo, para depois, tornarem-se carrascos das expectativas das quais tornaram-se fiéis depositários?
a mobilização e busca de alternativas de um povo em desespero é utilizada pela hábil manipulação dos destinos, das sensações e dos interesses de cada um, pelas mídias que, associadas ao poder econômico, reconduz, com o passar do tempo e pela alternância dos personagens desse baile de máscaras chamado política, seus parceiros na função de oprimir, fazendo assim, autofagicamente para eles, o povo dar mais um passo rumo a autoconsciência e seu papel social, crescendo individual e coletivamente na incorporação de sua própria Liberdade. Esse processo de crescimento é dialético, entre a opressão e o oprimido.

Vivemos uma grande selva, onde a única coisa que nos une, é a volátil tentativa de superarmos tantos desamparos individuais tornados coletivos (sic), pela soma de desesperos pessoais contra as opressões, paulatinamente conscientes, que nos provocam, nos desafios cotidianos, a fugaz esperança de que o único caminho é entender cada "inimigo" exterior como mais um degrau do descobrimento de nossas forças interiores.


Na superação de tantas opressões que, como "cercas exteriores", nos desafiam a descobrir nossas forças e nesse atrito, geram Luz, conseguiremos, mesmo que parcamente, visualizar a nós mesmos, em nossa trágica e desafiadora circunstância do existir, rumo a quem Somos.
De tudo sempre ficará uma certeza, seremos gratos a tudo aquilo que nos desafia pois é semente de descobertas de tudo o que podemos, dentro e fora de nós, individual ou coletivamente.

O tempo é de emoção, de um fogo que consome, mas, parafraseando Jorge Luis Borges, "nós somos o Fogo".



Gildo Fonseca




sexta-feira, 7 de junho de 2013

Diferenças

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A ótica do processo evolutivo é individual. Então sempre veremos as experiências nossas e dos outros pelo grau de nossa pretensa maturidade evolutiva. Isso implica então em percebermos e aceitarmos que muitos ainda precisam passar por experiências de dor, sofrimento e frustração que farão com que eles também, assim como nós, subam degraus que lhes permitam uma maior Lucidez. É triste ver pessoas trilharem caminhos que, conhecemos, por experiência, como insanos. Sabemos, por experiência, que vai "doer", mas eles precisam, assim como todos nós vivenciamos algum dia, o passar por isso, precisam da dor e do sofrimento para desenvolverem um alto grau de tolerância à frustrações que virá somente com o tempo, depois de sofrerem muitos desenganos tanto na experiência individual como na coletiva. A Inteligência é uma ferramenta poderosa que pode ser utilizada pela Virtude ou pela Canalhice, a depender das necessidades, também evolutivas, de cada um de seus manipuladores. A responsabilidade ética pelos menos afortunados quanto à Percepção da Vida, pertence somente à Consciência dos Lúcidos. Se essa "inteligência" é usada para o bem ou para o mal faz parte do jogo do existir que vai fazer com que aqueles que não entendem porque são oprimidos venham a entender, infelizmente pela dor, frustração e "murro em ponta de faca", que a construção da escada de suas próprias consciências dependerá sempre e muito da sua tentativa de entender o porque de suas próprias experiências. Quando entendemos a razão de qualquer sofrimento ele se dissolve pelos raios luminosos da nossa Consciência por trânsito permanente em tantas impermanências. Quem "acredita" saber mais, com certeza sofre mais, pois compreende a dificuldade consciencial de todos aqueles que tateiam dolorosamente em busca do despertar. Me fascina apreciar os contrastes entre os diferentes tipos de pessoas, me fazem compreender as singularidades e suas características, independentemente do momento em nosso estágio da Caminhada Evolutiva. Interessante também ver como muitos gostam e precisam de "santos", "líderes", "seres" e "coisas" que lhes sejam "âncoras" para sua próprias e momentâneas convicções. e essa é uma "brecha" por onde manipuladores coletivos de consciências, exercem sua maléfica atuação. Cabe, na minha humilde opinião, a todos nós, assistirmos esse filme, onde ora somos protagonistas, ora somos coadjuvantes, para ver no que vai dar, oprimidos sem consciência de sua opressão e  opressores sem consciência do Amor. É certo que, muitos, como eu, podem acreditar que as mesclas, os contrastes, compõem um mosaico, a ser permanentemente preenchido, em cada experiência, em cada convivência, e que vão muito além de circunstanciais necessidades da dimensão experimental, vividas por todos nós num determinado momento da nossa Percepção Consciencial. O importante, talvez seja, na verdade, a Caminhada, essa "Luz' que nos permite "ver" e "olhar" para a soma de singulares pontos que compõem nossas retas e nossos planos onde vivenciamos essa coisa chamada "existir". Nietzsche tinha razão quando afirmava "quem tem um porquê pode suportar quase qualquer como". Busquemos nossos singulares, transitórios e contrastantes "porquês" em cada  uma de nossas fugazes e transitórias percepções, percebendo, em cada "diferença" entre coisas, pessoas e fatos, mais uma parte da soma dos elementos que compõem o quadro de nossa transitória e momentânea Consciência. Já dizia Heráclito, "nada é permanente, exceto a mudança".

Gildo Fonseca.


quinta-feira, 6 de junho de 2013

Álvaro de Campos - Fernando Pessoa

Compartilhado de Mariah de Olivieri:


Acordar

Eu adoro todas as coisas
E o meu coração é um albergue aberto toda a noite.
Tenho pela vida um interesse ávido
Que busca compreendê-la sentindo-a muito.
Amo tudo, animo tudo, empresto humanidade a tudo,
Aos homens e às pedras, às almas e às máquinas,
Para aumentar com isso a minha personalidade.

Pertenço a tudo para pertencer cada vez mais a mim próprio
E a minha ambição era trazer o universo ao colo
Como uma criança a quem a ama beija.
Eu amo todas as coisas, umas mais do que as outras,
Não nenhuma mais do que outra, mas sempre mais as que estou vendo
Do que as que vi ou verei.
Nada para mim é tão belo como o movimento e as sensações.
A vida é uma grande feira e tudo são barracas e saltimbancos.
Penso nisto, enterneço-me mas não sossego nunca.

Para Lacan (1977)" a poesia é um efeito de sentido,bem como um efeito de furo. Poète (poeta) é sentido. Pohàte é furo. " Philippe Julien, " O fim de uma sessão", Trabalhando com Lacan"

" Lacan amava a poesia e acreditava nela como possibilidade de acesso ao real e no ato poético como matriz do ato analítico." 

Angústia existencial

Foto: A CULTURA SEMPRE CONDUZ CORPOS SEM ALMA



Filosofia - Colaboradores - (coordenado Por Virgínia Fulber)
e com a colaboração de autores convidados.

O problema filosófico da Angústia Existencial
Mariah de Olivieri


Privar o homem da angústia para melhor dominá-lo, é despojá-lo de sua verdade, arrancar sua coragem, inocência e alegria – também seu desgosto – de viver. É querer reduzir à animalidade, é pecar contra seu espírito. 
Henri Pradal


O problema da angústia existencial foi ao logo dos séculos, profundamente examinado por alguns filósofos, que se depararam com esse sentimento em suas existências. Não foi por puro acaso que, ao interessarem-se pelo tema da existência, do destino e suas de conseqüências, o tema da angústia tornou-se o tema de suas vidas.
Neste artigo discorreremos sobre o significado da angústia para Kierkegaard, Heidegger e Karl Jaspers. Estamos cientes de que outros filósofos e estudiosos do pensamento e emoções humanas discorreram sobre o tema da angústia; porém, nos ativemos aqui, a debruçar nosso olhar somente sobre pensadores com os quais nos identificamos, por suas idéias sobre o tema.
A angústia existencial é um sentimento difuso e desconcertante que sufoca a existência e impregna a vida do indivíduo de tristeza e dor; é uma zona limítrofe, um pântano de sombras aterrorizantes, um emaranhado de sentimentos incongruentes, um abismo profundo, que o indivíduo carrega dentro de si.
Inúmeras vezes, em seu cotidiano, o indivíduo sente a falta de algo incompreensível; o resultado é tédio e vazio existencial, ao qual ele é remetido sem aviso prévio. As aquisições materiais, e as vitórias amorosas não preenchem o âmago do seu ser.
O sujeito está em uma constante busca. O ser humano é um mar de infinitas possibilidades, que muitas vezes foram castradas, amordaçadas. Assim, por causa desse afeto ele se torna uma criatura profundamente marcada, mutilada em sua alma, cuja dor perpassa sua compreensão.
Sensação de devastação interna, sentimento de impotência. Para entender a angústia, esse sentimento tão subjetivo, é necessário primeiro compreendê-lo; aceitar essa impressão que torna o indivíduo absolutamente débil, frágil, desorientado.
O indivíduo compõe o mundo através das circunstâncias vividas, das experiências e sentimentos suscitados pelas mesmas; ele é para essa composição uma complementação e, quando se sente fora de tudo isso, abandonado nesse vazio profundo, surge a angústia.
Diante do vazio e do desconhecido, o indivíduo se assusta, pois em seu cotidiano ele lida sempre com situações concretas sejam atividades ou de trabalho, ele está sempre envolvido com outros indivíduos, e estar só é considerado deprimente.
Para a filosofia, a angústia existencial projeta-se por uma ambigüidade conceitual; se por um lado, ela assusta, por outro, permite ao indivíduo encontrar-se com algo maior, que o lança para a condição de sua irremediável finitude e limitações diante de sua existência. Paradoxalmente, a angústia aponta a possibilidade de ser e de existir no enfrentamento da vida, como uma força que emana desde dentro.
Ao refletirmos sobre o significado filosófico da angústia, encontramos o pensamento de Kierkegaard[1]; em seu livro O Conceito de Angústia (1844), atribui que a raiz da angústia é a existência como possibilidade. Esta asserção aponta tratar-se de uma disposição afetiva; algo que impulsiona o sujeito nos seus próprios movimentos.
Heidegger[2], em Ser e o Tempo (1989), anuncia que é a angústia que possibilita ao indivíduo o encaminhamento à um encontro com o Ser, num direcionar ao nada, que permite a abertura de caminhos para o indivíduo encontrar-se com algo não descrito, rumo ao seu destino. Cito Heidegger:
É na disposição da angústia que o estar-lançado na morte se desentranha para a pré-sença de modo mais originário e penetrante. A angústia com a morte e a  angústia da com o poder-ser mais próprio, e remissível e insuperável.
Heidegger discorre sobre o fato da angústia libertar o homem das possibilidades nulas e torná-lo livre para as autênticas.  É pelo fato de ser livre que o Ser-aí pode fugir das responsabilidades para permanecer no nível de uma existência exteriorizada, mas essa fuga está sempre perseguida pela angústia.
 A angústia contém aspectos tanto destrutivos como construtivos, dependendo de como é utilizada. O Ser-aí é lançado na existência, na facticidade. A angústia constitui-se como estrutura fundamental do Ser-aí tal como se encontra primeiramente e antes de tudo, em seu mundo no cotidiano.
A angústia pode surgir nas situações mais inofensivas e não precisa do escuro para se manifestar. O angustiar-se com alguma coisa não possui nem o caráter de espera nem de entendimento, assim a insignificância do mundo é aberta na angústia.
A angústia angustia-se pela presença nua e crua, lançada na estranheza e surge do porvir da de-cisão.  É nela que o sentido do Ser-aí (sua essência) se anuncia.
 Heidegger relaciona a angústia com o temor. Aquilo que a angústia se angustia é o ser-no-mundo como tal. Porém, na angústia não se dá o encontro disso ou daquilo com o qual se pudesse estabelecer uma conjuntura ameaçadora. O ameaçador não vem de um lugar determinado, ele não se encontra em lugar algum.
O indivíduo não sabe o que é aquilo com que se angustia. Aquilo com que a angústia se angustia é o nada, que não se revela em parte alguma. A angústia de acordo com Heidegger se angustia com o mundo como tal, com o próprio ser-no-mundo.
Heidegger afirma que se angustiar abre, de maneira originária e direta, o mundo como mundo. A angústia não é somente angústia com, mas enquanto disposição, é também angústia por.  Na pré-sença, a angústia revela o ser-livre para a liberdade de assumir e escolher a si mesmo.
Assim é que, a angústia enquanto disposição fundamental empreende uma abertura para o desconhecido, ela se eleva a partir do ser-no-mundo enquanto ser-lançado-para-a-morte; é ela que libera o indivíduo de possibilidades nulas, tornando-o livre para as possibilidades próprias. Quando a angústia passa, diz-se costumeiramente: propriamente não foi nada.
Neste construto existencial, Olga Hack, em seu artigo sobre a angústia, cita Jean Barraud, em O homem e sua Angústia, e aponta que: quando esta surge de frente e derruba pontes que unem as margens, provoca um despertar e torna a lucidez mais incisiva.
Porém, a angústia se faz e se mostra a sua maneira e nem sempre o indivíduo tem uma leitura precisa para ela. Quando o indivíduo se dá conta, neste desvelar, e permite tal abertura, ele entra pelo caminho que Aristóteles dizia ser o do espanto; essa é a condição de contemplação do indivíduo, sob sua própria condição de existência enquanto possibilidade. Essa construção e condição de contemplação vêm integrar um olhar original para a angústia, que permite descortinar através desse processo, novas e infinitas possibilidades.
Karl Jaspers[3], em Filosofia da Existência (1974) anuncia que angústia, liberdade e transcendência estão interligadas; a verdadeira liberdade nasce da relação com a transcendência e o processo existencial é uma meditação racional nos confins da condição humana.
Desse modo, não existe comunicação existencial sem razão e liberdade. Jaspers esclarece: a existência é suscitar a liberdade e a existência não é possível, senão em face da transcendência e a transcendência não tem sentido, senão pela existência.
 Sem vínculos com a transcendência, não existe liberdade. A existência do indivíduo está situada de forma singular, e presa irremediavelmente a uma série de situações que escapam de seu controle. Jaspers chama estas situações de momentos nos quais o indivíduo não tem poder de escolha, cito Jaspers:
A existência só desperta quando o existente é sacudido pela idéia da morte. A existência ou se perde no desespero face ao nada ou se revela a si mesma na certeza da eternidade.
A existência procura a experiência das situações-limite, esforçando-se por aprofunda-la até lhe encontrar um sentido que a reintegre em sua autenticidade. A experiência da morte é para Jaspers uma situação limite, pois segundo ele:
Estamos todos destinados à morte, ignorando o momento em que ela virá, procedemos como se nunca devesse chegar. Em verdade, vivendo, não acreditados realmente na morte, embora ela se constitua a maior de todas as certezas.
Diante da morte, a existência autêntica descobre a angústia de uma forma radical, que é a angústia de perder-se enquanto existência. São nas situações-limite que a existência se torna possível.
É somente no desespero de uma situação-limite que o ser encontra a sua certeza, uma vez que: daí ocorre à idéia de que estar morto é não-ser, de que a morte é o nada.
E é tendo a consciência bem clara daquilo que ela não pode mudar, e opondo-se à resistência das situações-limite e graças a elas, (reconhecidas como condições primordiais), que a liberdade pode se concretizar.
É somente no desespero gerado por uma situação-limite que brota, portanto, toda a obscuridade e negatividade desesperadora da condição humana. É através das situações-limite que o indivíduo sofre o aniquilamento, caminho que o conduz à existência.
Jaspers era apaixonado pelo mistério da condição humana e convencido de que existiria um para além do conhecimento que é possível ao indivíduo atingir; ele apelava para o tesouro que todo indivíduo possuía em si, ou seja, a capacidade de se elevar acima de seu ser.
Para Jaspers, viver era escolher. A obrigação de efetuar uma escolha responde efetivamente ao imperativo categórico de Kant, como ele o formulou nos Fundamentos da Metafísica dos Costumes; a exigência de que o indivíduo deve agir segundo a máxima: “tu deves, logo podes” (1785 Paris).
O objeto da escolha depende, segundo Jaspers, somente de cada um; se o indivíduo deve escolher para existir, uma incerteza sempre o impedirá de saber (de certa maneira), o que ele será realmente, ou se conseguirá efetivar e realizar sua escolha. A existência, objeto de um dever de escolher, é realmente o objeto de uma aposta. No seu entender, o indivíduo, ao se fazer a si mesmo, acaba sendo determinado unicamente por suas escolhas.
A existência parece então, aos seus olhos, como uma vontade de existência sem limites; ela é um combate perpétuo, entre o dever e a incerteza, fora de todo o conhecimento. Esta experiência é sentida por Jaspers como uma experiência de dilaceramento, de angústia. Contudo, só através das situações limites, brotam toda a obscuridade e negatividade desesperadora da condição humana.
 É através dessas situações que o indivíduo sofre o aniquilamento, mas esse aniquilamento é também o caminho que o conduz à existência. Pois sem a ameaça do desespero possível, não há liberdade.
Desde modo, as aspirações a uma liberdade total da vida e das suas condições, não são mais que evasões diante das condições reais da existência possível, que são aquelas que permitem fazer verdadeiras escolhas e assumir verdadeiras responsabilidades.
Ao pretender uma liberdade total para a condição humana, o indivíduo, com seus excessos, escamoteia os verdadeiros possíveis de uma liberdade que as situações-limite restringem e estruturam. De acordo com Jaspers o indivíduo não encontra o absoluto senão através das situações-limite.

[1] O conceito de angústia. 1844. Tradução de Álvaro Luiz Montenegro Valls, a partir do original de SKS 4, (manuscrito), em andamento, 2008.
[2] Ser e o Tempo. Parte II. 1989. Tradução de Márcia de Sá Cavalcante. Coleção Pensamento Humano. Petrópolis: Vozes, 340p.
[3]  Filosofia da Existência. 1974. Buenos Aires: Aguilar, 1ª ed. 128 p.
Mariah de Olivieri - É Bacharel em Comunicação Social, Mestre em Filosofia e  Terapeuta-Especialista em Essências Florais. Mantém uma coluna mensal no Jornal Varanda Cultural – Porto Alegre. Participa do Núcleo de Estudo, Pesquisa e extensão em Educação Estética Onírica – NUPEEO na FURG, em Rio Grande , trabalhando a linha de pesquisa Educação estética onírica no despertar dos sonhadores.