domingo, 30 de abril de 2023

Em grego, há vários nomes para a “alma”. O mais original é “Psiquê”. Não por acaso, na mitologia Psiquê era o nome próprio de uma jovem. Diferentemente do termo “Razão”, princípio masculino , Psiquê não é conceito teórico, Psiquê é nome próprio.
Psiquê não é o nome de apenas uma parte da alma, mas da alma inteira. Psiquê não era somente raciocínio. Ela era isso também e mais sensibilidade, intensidade, beleza , generosidade , coragem, coração e poesia.
 
Enquanto a Razão tem a pretensão de existir e pensar sozinha (exemplos disso são o racionalista Descartes, com o seu ensimesmado “Penso, logo existo”, e o rígido Kant com sua “Razão Pura”) , Psiquê só se viu inteira quando encontrou sua companhia.
 
A companhia de Psiquê é Eros, o Amor. No seu sentido originário, a palavra “amor” nasceu da reunião da partícula “a” com função privativa ( como em “a-fasia”, “não fala”) mais a abreviação da palavra morte ( “mor”). Assim, “amor” é : “não morte” ( nos vários sentidos que a morte pode ter).
 
É na companhia de Eros , agenciada com ele, que Psiquê resiste à morte; e é na companhia de Psiquê que Eros aprende que ele mesmo não sabe tudo o que pode.
A “alma” possui ainda outro nome: “pneuma”. Essa palavra costuma ser traduzida por “sopro”. Em latim, “spiritus”. Porém pneuma, ou spiritus, não é o sopro que a gente expira ( quando colocamos o ar para fora). Pois pneuma designa o ar que a gente inspira, puxando o ar para dentro de nós .
 
Quando a gente expira, é a gente que sopra; mas quando a gente inspira é a própria vida que sopra dentro de nós, e assim nos conecta com a respiração da própria Mãe-Terra. Somente aqueles a quem a vida inspira e enche de ar vital perseveram para ser inspiração para os outros se encherem de vida também, por maior que seja o sufoco...
 
Quando o bebê sai do ventre e nasce, o ato que inaugura seu respirar é o inspirar que o enche de vida. Esse inspirar inaugural não é feito apenas pelo seu pequenino pulmão, mas por todo seu corpo. Este é o sentido original de “inspiração”: “encher-se de vida para intensificar a vida que vive em nós”, para que não nos falte o ar do possível...
 
Na verdade, a tradução mais correta de “pneuma” não é “sopro”, e sim “brisa úmida”, também ideia feminina, como aquela brisa que , vinda do oceano, ao deserto estéril vivifica.
 
É de um sopro potente assim , sopro que precisamos intensificar em nós pessoal e coletivamente, é de um Pneuma assim de que fala o escritor Nikos Kazantzákis: "Por toda parte , estremecendo, sentimos o mesmo Sopro gigantesco que, escravizado, luta por libertar-se".✨

Elton Luiz Leite de Souza - Imagem: Arte de Lionel Royer
 
Compartilhado do FB, pg. Psiquê - Alma e Conhecimento - Kátia de Souza

sábado, 29 de abril de 2023

Se meus demónios me abandonarem, temo que os meus anjos desapareçam também.

Rainer Maria Rilke

Giacóia, sobre Nietzsche, direto na jugular da alma. Disse TUDO !!!

O insuportável não é só a dor, mas a falta de sentido da dor, mais ainda, a dor da falta de sentido.

Ante as asperezas sentidas pela alma diante da densidade da matéria, ante as contingências do Existir, ante os procustos cotidianos de todos nós, entre tantos nós, ante a inexorabilidade da superação diante de qualquer escuridão, aqui ou mais além, podemos relembrar a frase de Virginia Woolf: "Não se pode encontrar a paz evitando a Vida".

Gildo Fonseca.

 

 

"Luz, mais luz..." Goethe, em seu leito de morte. 


 

"Eu preciso de você ?"

Além dos nutrientes dos alimentos que consumimos, além do oxigênio que respiramos, além da água que bebemos, há mais uma coisa igualmente importante. A função normal do cérebro depende da teia social, nossos neurônios precisam dos neurônios dos outros para se estimular, prosperar e sobreviver.

O esforço feito para conhecer o rosto de um amigo, dirigir um carro e entender uma piada parece pequeno. Mas neste instante redes em seu cérebro estão movimentadíssimas: bilhões de sinais elétricos disparam pelas células, ativando pulsos químicos em trilhões de conexões entre neurônios. Cada cérebro é integrado a um mundo de outros cérebros. Seja por uma mesa de jantar, uma sala de aula ou até mesmo de papos virtuais. Todos os neurônios humanos do planeta se influenciam, criando um sistema de complexidade inimaginável.

Fonte: Cérebro - Uma Biografia By David Eagleman

O valor de uma coisa é a sua desejabilidade - trata-se de saber se ela é digna de ser desejada, se é desejável que a desejemos. Jacques Lacan, 1959-60.

Um dos problemas da psicologia que ignora suas bases biológicas é que questões mentais perdem sua concretude.
Você já deve ter ouvido por aí coisas como:
- "depressão é frescura",
- "isso é coisa da sua cabeça"
- "é só pensar positivo".
Os fenômenos psicológicos são biológicos, em sua base.
Quando há uma dor psicológica causada por rejeição social, por exemplo, há ativação de regiões do cérebro associadas à sensação de dor (assim como quando a dor é causada por danos físicos diretos no corpo).
A psicologia sem corpo é uma psicologia fora do mundo real.

"Quando a consciência se torna uma chama, queima toda a escravidão que a mente criou."
Osho.

"SONHAR UM SONHO IMPOSSÍVEL

SOFRER A ANGÚSTIA IMPLACÁVEL
PISAR ONDE OS BRAVOS NÃO OUSAM
REPARAR O MAL IRREPARÁVEL
AMAR UM AMOR CASTO A DISTÂNCIA
ENFRENTAR O INIMIGO INVENCÍVEL
TENTAR QUANDO AS FORÇAS SE ESVAEM
ALCANÇAR A ESTRELA INATINGÍVEL
ESSA É A MINHA BUSCA"
Dom Quixote - Miguel de Cervantes

Sabia que Nelson Rodrigues era também filósofo?


 

ceticismo pirrônico na prática...


 

Camus, estrangeiro maravilhoso...

"O que significa o despertar súbito - nesse quarto obscuro - com os barulhos de uma cidade de repente estrangeira? E tudo me é estrangeiro, tudo, sem um ser para mim, sem um só lugar onde abrigar essa mágoa. O que faço aqui, o que significam esses gestos, esses sorrisos? Não sou daqui - também não sou de outro lugar. E o mundo não é mais do que uma paisagem desconhecida onde meu coração não encontra mais apoio. Estrangeiro, quem pode saber o que essa palavra quer dizer" -

Albert Camus


 

 




Nos interstícios, entre as percepções, reina a Possibilidade, útero da criação, à espera do olhar semeador, rebelde, sangue pulsante das almas indômitas, eternamente insubservientes às mortes de tantas inações cotidianas da Consciência.

Gildo Fonseca.
 

A INDIVIDUALIDADE DO FLUXO
A dor é uma Individualidade que não pode ser expressada enquanto personalidade. Seus ecos refletirão somente na permeabilidade das ressonâncias das alteridades, na equivalência de suas intensidades perceptivas. A alegria também é assim. Nosso, é o Sentir. Sua ampliação, pela propagação vibratória envolvente com outros corpos, seres ou entes, mescla nossa alma com essas Interações. Assim, nos tornamos, conscientemente, o Fluxo, que reina na medida em que se descobre através de toda transitória e volátil relatividade.
Gildo Fonseca 

PÃO NOSSO DE CADA DIA.
A alma é um corpo em formação alimentado pelas proteínas do líquido amniótico das circunstâncias. Ora como protagonista, ora como coadjuvante, nossa pretensiosa lucidez flui pelo cordão umbilical das realidades onde bebe do cálice da busca de todo entendimento. Embriaguemo-nos em cada olhar, em cada vivência, no mergulho profundo de cada instante, extraindo, sementes que germinam, permanentemente a Construção de nossa Consciência. Gildo Fonseca.

domingo, 23 de abril de 2023

PERCEBER, UM EQUILÍBRIO DINÂMICO ENTRE LUZES E SOMBRAS
 
A sobrevivência, física e psíquica, requer uma dualidade perceptiva. Da dialética entre dois pontos de apoio, a matéria e seus reflexos em nós, em meio a tantos nós cotidianos, surge a dinâmica Consciência, condenada à Liberdade da Escolha como dizia Sartre.
 
O substrato dessas experiências não tem lastro, não tem sustentação, não tem porto nem cais pois é sempre uma nova experiência. Quando julgamos algo, ou alguém, aquilo já não É mais. Em seu movimento já mudou, mudou em si, mudou para nós, já é diferente. Nossa percepção é dinâmica, a sensação é dinâmica, nunca conseguimos chegar à essência das singularidades pois são flutuantes, infinitas e ao mesmo tempo infinitesimais.
 
Somos o próprio movimento criando viagem, criando Vida. Avaliar alguém ou alguma coisa seria apoiar-se apenas em algum dos binários pontos de sustentação, o "externo" ou o "interno". 
 
O que nos resta? Apreciar na tela do espelho da vida o show de luz e sombras dos contrastes das experiências, das vivências cotidianas, na busca do equilíbrio de cores selecionadas por nossas palpitantes pupilas impactadas pela intensidade de cada momento.
 
Gildo Fonseca.
 
Foto: A pose de beber, Reedling barbudo (Panurus biarmicus). Foto: Edwin Kats. Imagem compartilhada da pág. de Lucília Oliveira.

 "Os preconceitos têm mais raízes do que os princípios". Maquiavel

segunda-feira, 17 de abril de 2023

"A tensão é quem você pensa que deveria ser.

O relaxamento é quem você é."

Provérbio Chinês

Jung sobre a solidão de olhares mais sensíveis

Quando criança me sentia só e ainda me sinto assim, porque sei coisas,  percebo coisas que outros parecem não conhecer e a maioria delas nem quer saber dessas questões. A solidão não consiste em não ter pessoas ao redor mas em não poder comunicar as coisas que parecem, para nós, importantes e precisar calar sobre certos pontos de vista que os outros acham inadmissíveis.

Carl Gustav Jung.

Sermão de Padre Antonio Vieira sobre a brevidade da Vida

"Homenzinhos miseráveis, loucos, insensatos, não vedes que sois mortais? Não vedes que haveis de acabar amanhã? Não vedes que vos hão de meter debaixo de uma sepultura, e que de tudo quanto andais afanando e adquirindo, não haveis de lograr mais do que sete pés de terra? Que doidice, e que cegueira é logo a vossa?"

Padre Antônio Vieira (1608-1697), Sermões - Tomo I, Hedra Editora.

sábado, 15 de abril de 2023

Haja colírio alucinógeno...

Do que vale olhar sem ver?
Johann W. Von Goethe

 

O problema é que "ver" é circunstancial, depende do que é temporal, fluídico, volátil, impermanente e para viver depende daquilo que ainda não é.

Gildo Fonseca.

sexta-feira, 14 de abril de 2023

Sossega coração

Sossega, coração! Não te desesperes! Talvez um dia, para além dos dias, encontres o que queres, porque o queres. Então, livre de falsas nostalgias, atingirás a perfeição de seres. Mas pobre sonho o que só quer não tê-lo! Pobre esperança a de existir somente! Como quem passa a mão pelo cabelo e, em si mesmo, se sente diferente, Como faz mal ao sonho o concebê-lo! Sossega, coração, contudo! Dorme! O sossego não quer razão nem causa. Quer só a noite plácida e enorme. A grande, universal, solene pausa, antes que tudo em tudo se transforme.
 
Fernando Pessoa

Amada, maga, magna, Clarice...


 

"Toda compreensão súbita se parece muito com uma aguda incompreensão." Lispector em "A Paixão Segundo G.H."

segunda-feira, 10 de abril de 2023

"Se me explico, me implico: Não posso a mim mesmo interpretar."

Friedrich Wilhelm Nietzsche, in prelúdio de A Gaia Ciência

domingo, 9 de abril de 2023

"Pois, no seio mesmo da paixão, nunca se deve tratar de "conhecer perfeitamente o outro"; por mais que progridam neste conhecimento, a paixão restabelece constantemente entre os dois este contato fecundo que não pode se comparar a nenhuma relação de simpatia e os coloca de novo em sua relação original, a violência do espanto que cada um deles produz sobre o outro e que põe limites a toda tentativa de apreender objetivamente este parceiro. É terrível de dizer, mas , no fundo, o amante não está querendo saber "quem é" em realidade seu parceiro. Estouvado em seu egoísmo, ele se contenta de saber que o outro lhe faz um bem incompreensível... os amantes permanecem um para o outro, em última análise, um mistério."

 Lou Andreas-Salomé

Tempos modernos e o poder da grana...


 

“O desígnio de ser feliz que nos impõe o princípio do prazer é irrealizável; mas não se deve - nem se pode - abandonar os esforços para se aproximar de qualquer forma da sua realização. (... ) Nenhuma regra sobre isso vale para todos; cada um deve procurar por si mesmo o caminho que pode ser feliz. Tudo depende da soma de satisfação real que pode esperar do mundo exterior e da medida em que se inclina a se tornar independente deste; finalmente, também da força que se atribui a si mesmo para modificá-lo conforme os seus desejos.”
 
*SIGMUND FREUD / O mal-estar na cultura (1929)

quinta-feira, 6 de abril de 2023

Sexta feira da paixão

O simbolismo dá crucificação

Newton afirma que um corpo permanece estático até que uma força o movimente. A matéria recebe a energia do Espírito que se fragmenta, pulverizando-se em pessoas, em circunstâncias, coisas e fatos, em múltiplos estados, criando Vida.

A crucificação de Jesus simboliza essa “pregação” do Espírito e seu elevado grau de vibração num choque com a densidade da matéria. Esse encontro, essa crucificação acontece sempre, em todos os instantes em que a Consciência percebe que, para existir, precisa de múltiplos contrastes, de luz e sombra, de diferenças, de tantas singularidade e de tudo aquilo que Ela ainda não é, mas que, para Ser, para Existir, precisa vivenciar, compreender. A lapidação das eternas sementes contidas em nossas almas começa em nosso interior, sob o palpitar das emoções cotidianas, num perene processo de auto reconhecimento, auto análise, discernimento e evolução.

Também quando Jesus afirma a Pilatos: “Eu Sou a Verdade”, Pilatos retruca “mas o que é a Verdade?” Jesus silencia pois sabe que “Verdade” é um processo, um estado em permanente mudança sob o Olhar fluídico da consciência em trânsito pelas impermanências. Nada mais eloquente que o buraco negro do silêncio quando não há ressonância no diapasão entre seres pois todos vibramos em escalas circunstanciais diferentes. O Absoluto não pode se realizar na relatividade embora cada relatividade seja, momentaneamente, absoluta para si mesma. A crucificação acontece em cada dissonância com o Outro e consigo mesmo, nos desencontros com a pretensa Verdade subjacente em cada ato, sempre fugidia e nem sempre encontrada.

A crucificação é um estado de espírito, acontece sempre e na intensidade do grau de sintonia com o Cristo interior de cada Um. O Cristo pode estar ali, sempre, na manjedoura de nossas almas mas pode também estar sendo crucificado, todos os instantes, pela ausência de nossa empatia com o Espírito onipresente em nosso entorno, a Vida que nos rodeia, como um espelho a demonstrar muitos dos insanos desvarios de nosso processo evolutivo.

Que nos salve a Páscoa interior de cada um de nós, simbolizada pelo Ovo do renascimento, do Amor, no celeiro da sinceridade, na plena consciência de que toda incompreensão e descaso é uma crucificação do Cristo que espera, pacientemente, para renascer em Nós.

Gildo Fonseca.

quarta-feira, 5 de abril de 2023

"É impossível enfrentar a realidade o tempo todo sem nenhum mecanismo de fuga". (Sigmund Freud)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

VIA ESPESSA - XI

De canoas verdes de amargas oliveiras
De rios pastosos de cascalho e poeira
De tudo isso meu cantochão tecido de ervas negras.
Grita-me o louco:
— De amoras. De tintas rubras do instante
É que se tinge a vida. De embriaguez, Samsara.

E atravessou no riso a tarde fulva.
 

Hilda Hilst

"Somos sempre levados para o caminho que desejamos percorrer."

Textos Judaicos