domingo, 1 de maio de 2022

Ceticismo pirrônico em Montaigne

 

Pascal tem razão quando reconhece em Montaigne
um autêntico pirrônico. Veja a famosa passagem do Entretien:

Ele coloca todas as coisas em uma dúvida universal e tão geral que
essa dúvida se volta sobre si mesma, isto é, que ele duvida se duvida e,
duvidando até dessa última proposição, sua incerteza gira sobre ela mesma
num círculo perpétuo e sem repouso; opondo-se igualmente àqueles que
asseguram que tudo é incerto e àqueles que asseguram que tudo não o é,
porque ele não quer assegurar nada.

 
É essa dúvida que duvida de si e nessa ignorância que se ignora, e que cha-
ma de sua forma mestra, que está essência de sua opinião, a qual não pode
exprimir por nenhum termo positivo. Pois, se diz que duvida, ele se trai
assegurando ao menos que duvida, o que, sendo formalmente contra sua
intenção, ele não pôde explicar senão por uma interrogação; de modo que,
não querendo dizer ‘eu não sei ́, diz: ‘Que sei eu?’, da qual faz sua divisa,
colocando-a sobre balanças que, pesando os contraditórios, encontram-nos
num perfeito equilíbrio: ou seja, ele é um puro pirrônico.

Fragmento de Cioran, em "Os coxos", onde cita Pascal e Montaigne.

Nenhum comentário:

Postar um comentário