domingo, 27 de julho de 2014

O Início do Declínio de Zaratustra

Quando chegou aos trinta anos, Zaratustra deixou sua pátria e o lago de sua terra natal e partiu para as montanhas.

Lá permaneceu, nutrindo-se de seu espírito e de sua solidão, sem se cansar. Dez anos se passaram. Seu coração, porém, mudou e, certa manhã, tendo-se levantado com a aurora, pôs-se frente ao Sol e assim falou:

"Tu, grande astro! Que seria de tua sorte, se te faltassem aqueles a quem iluminas? Há dez anos continuas subindo até minha caverna. Se eu, minha águia e minha serpente não estivéssemos aqui, tu te haverias cansado de tua luz e deste trajeto.

Nós, porém, te esperávamos todas as manhãs para recebermos teu supérfluo e por ele te rendermos graças.

Pois bem, já ando farto de minha sabedoria, como a abelha que acumulasse demasiado mel. Sinto necessidade de mãos que se estendam para mim.

Quem dera eu pudesse prodigalizar e repartir até o dia em que os sábios, entre os homens, se sentissem felizes por sua loucura e os pobres, felizes por sua riqueza.

Por isso, preciso descer às profundidades, como tu fazes todas as noites, quando mergulhas para além do mar para levar tua luz ao mundo subterrâneo, astro que tudo superas.

Como tu, preciso declinar, como dizem os homens, entre os quais preciso descer.

Abençoa-me, pois, olho afável que pode ver sem inveja até mesmo o excesso de felicidade!

Abençoa a taça que quer transbordar, a fim de que dela escorra a torrente de ouro e que todos os lugares de tua delícia ela leve o reflexo!

Eis que esta taça quer esvaziar-se de novo e Zaratustra quer voltar a ser homem".

Esse fora o início do declínio de Zaratustra.

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