quarta-feira, 17 de junho de 2020

Evoé Fellini, Evoé Borges !!!

Frederico Fellini sobre Borges
Borges me comunica sempre uma singular exaltação pacificadora por causa da sua vocação prodigiosa de aprisionar, mesmo que seja por um instante, entidades tão ambíguas e enrarecidas quanto o tempo, o destino, a morte, os sonhos, em operações mentais portentosas e refinadas, em mecanismos conceituais poderosamente simplificados, livres dos oropéis da lógica, dos jogos de equilíbrio da dialética. Principalmente para um homem de cinema, Borges é um autor particularmente estimulante quanto a que o excepcional da sua literatura consiste em ser muito parecida com o sono, como uma extraordinária visão onírica ao evocar do subconsciente imagens inatas onde a coisa e o seu significado coexistem simultaneamente exatamente como em um filme. E justamente como nos sonhos, também o inconsistente de Borges, o absurdo, o contraditório, o arcaico, o repetitivo, ainda conservando toda a sua virulenta carga fantástica, são igualmente iluminados como os rigorosos detalhes de um desenho mais amplo e negligenciado, são os elementos impecáveis de um mosaico atrozmente perfeito e indiferente. Também Borges, me faz pensar em um fluxo onírico descontínuo, e a heterogeneidade desta mesma produção - relatos, ensaios, poesias - prefiro imaginá-las, não como o fruto das múltiplas molas de um talento impaciente, mas sim como o sinal sem decifrar de uma metamorfose infatigável.

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