sábado, 31 de março de 2012

Novas pérolas de Rita de Cassia



eu lembrei do Capítulo XVII e XVIII do Purgatório da Divina Comédia. Lá, como Dante tem muitas dúvidas, Virgílio (autor da poesia épica latina, "Eneida"), que é o guia de Dante durante o Inferno e Purgatório, faz uma descrição maravilhosa do amor e suas nuances... essa talvez, seja uma das melhores definições que já vi:
Canto XVII-XVIII
- Jamais existiram criador nem criaturas sem amor natural ou sem o amor racional que o ânimo busca. O natural nunca erra. O outro poderá errar, ao escolher mal o objeto de seu amor, por excesso, ou por falta de vigor. O amor que se fixa no bem supremo, ou nos bens secundários com moderação, não pode ser causa de mal. Mas quando pende ao mal ou busca o amor com mais ou menos força do que se deve, emprega a sua criação contra o criador. E assim, poderás entender como o amor é ao mesmo tempo a semente de toda virtude e de todo ato que merece punição. Como o amor nunca pode querer mal a si próprio, nem pode querer mal àquele que o criou, o mal que se ama é o mal a seu próximo, e este se divide em três modos:
Os primeiros só admitem a própria glória, mesmo que isto signifique a ruína do próximo (orgulhosos, soberbos);
Depois há os que preocupam-se com a possibilidade do outro crescer e acumular mais fama e poder que eles (invejosos);
Finalmente, existem aqueles que, por injúria sofrida, explodem em ira, e só pensam em revidar o mal causado (iracundos).
Esses três tipos de amor pervertido vistes sendo purgados lá embaixo. Agora, veremos os que buscam o bem, mas de modo faltoso. Cada um imagina vagamente, algum bem que deseja, e se deixa levar pelo desejo de encontrá-lo. Se o amor que vos impele a essa meta é lento e preguiçoso, é nesta cornija que vós o expiarás. Há outro bem que não traz felicidade, pois não vem da boa essência que é fruto e raiz de todo o bem verdadeiro. O amor que perde ao tender a esse bem em excesso é purgado acima, nos próximos três terraços (melhor dizendo, são três círculos, a saber: avareza, gula e luxúria). Não falarei deles agora. Tu os descobrirás quando lá cheg armos.
- Então presta atenção - respondeu-me - e terás esclarecido o erro dos cegos que decidem ser guias. A alma, que é criada com capacidade de amar, move-se para o que lhe dá prazer. Vossos sentidos extraem do mundo real uma imagem que é exibida internamente. É esta imagem que atrai a alma. E se ela é atraída, à imagem então se inclina, e esta inclinação é o amor, que faz parte de vossa natureza. E assim como o fogo se move para as alturas, buscando a sua própria natureza, da mesma forma vossa alma busca a coisa amada e não descansa até encontrá-la e dela usufruir. Podes agora entender como estão enganados aqueles que acham que qualquer amor é, em si, coisa louvável. Talvez assim pensem por acharem que sua essência é sempre boa, mas nem todo selo é bom, ainda que boa seja a sua cera.
- Teu discurso me esclareceu muitas dúvidas - respondi-lhe - mas ao mesmo tempo acrescentou outras. Se o amor vem de uma fonte externa, a alma não pode ter culpa em aceitá-lo e não pode ser, por essa razão, julgada culpada em segui-lo.
- Eu só posso te explicar aquilo que minha razão puder compreender - respondeu Virgílio. Além da razão, terás que buscar o auxílio de Beatriz, pois se trata de obra da fé. Toda essência, esteja ela ligada ou não à matéria, tem a sua própria virtude, que não é percebida a não ser por seus efeitos, como o verde de uma planta revela-nos a sua essência viva. Não é, portanto, possível saber a origem das vossas inclinações ou do vosso instinto. Esses desejos inatos não são, portanto, nem condenáveis nem louváveis. Mas, para manter vossos instintos sob controle, tens uma virtude inata que, munida da razão, vos aconselha. É neste princípio que repousa o vosso poder de julgamento, que é capaz de rejeitar o mau amor e acolher o bom. Aqueles que, através do raciocínio, investigaram este assunto profundamente, perceberam essa liberdade inata e a partir dela, deixaram suas doutrinas morais e éticas no mundo. Então, posto que por necessidade surja em vós qualquer amor, em vós também está o poder de dominá-lo. Essa é a nobre virtude que Beatriz entende por livre arbítrio. Lembra-te disto quando tu a encontrares.
_______________

Entra em cena a Tiza:
Impressiona-me que, nesses dias de tantas facilidades e descompromisso, surjam questionamento em jovens sobre o amor verdadeiro. Este assunto nos remete às dúvidas de alguns quanto ao amor de Jesus e Madalena. Poderia ter pregado o verdadeiro amor, Aquele que por ninguém houvera se apaixonado? Caberia particularidades no amor Divino à ponto de personifica-lo em uma, entre tantas as mulheres? Seria deste amor que Ele veio falar? Seria, por acaso, do amor à família?
Existe uma palavrinha milagrosa que se chama Misericórdia, e esta é a chave do Amor. "Ide e entendei, eu quero a misericórdia, e não o sacrifício". Os pares humanos ainda se formam sob carências, sob necessidades materiais, sob afinidades, sob diferenças, sob aparências, sob tantas quantas são nossas fraquezas e forças; e ainda e sobretudo sob o que fazemos diante das fraquezas e forças de nossos companheiros de jornada; Pisoteamos? Invejamos?, Adulamos? Distinguimos? Privilegiamos? Abusamos? Exploramos? Cuidamos? Curamos? Sacaneamos... Como encaramos nossas diferenças? Como elos ou como armas?
Nossas escolhas amorosas são feitas muito antes que a puberdade se manifeste, que o corpo anseie, que o desejo nos traia. Elas são feitas desde a mais tenra idade, numa crescente compilação de dados, de impressões, experiências, sonhos, desejos, necessidades que, combinados, fazem o coração saltar em êxtase quando nos deparamos com o grande amor de nossas vidas. O que vai definir a escolha boa ou ruim vai depender de como você catalogou seus dados, trabalhou seu ser, de que espírito estava imbuído ao construir seu perfil, com que inspiração pode contar, contar e nutrir-se. Tornou-se revoltado? Tímido? Galante? Arrogante? Exibido? Tarado? Complexado? Carente? Ermitão? Somando genética e educação, poderemos desviar mais ou nossos olhos das imposições sociais a que todos estamos sujeitos, poderemos nos armar contra ou a favor do que a massificação exige, poderemos amar o que convém e reconhecer o que não convêm; porque a confusão existe neste estágio de nossas vidas, nossa luta maior é contra o engano, contra valores vãos... Mas é difícil e laboriosa nossa ascensão aos céus do amor perfeito. Falta-nos coragem, falta-nos discernimento, falta-nos paciência, falta-nos principalmente guias exemplares, e ainda que existam, existe toda uma estrutura a ser derrubada para que os possamos ver sem as ilusões e rótulos que nos norteiam; afinal, este mundo não dá trégua a quem procura vencê-lo, e tem suas armas para fazer desacreditar-se da verdade.
Existe um amor primeiro que nos concede auto-estima, pouca ou muita, ou exemplarmente equilibrada. Ela começa no berço, na perfeita condução de nossa educação e crescimento. Numa mesma família, marcas diferenciadas são deixadas em cada membro da mesma, porque existe algo de único em cada um, de bom e de ruim, que é meta individual vencer, mas que um bom orientador espiritual muito ajudaria. O exercício da misericórdia começa no lar, no questionamento sincero de todos para com todos no que há de bom e no que há de erro: "O que você quer?". Os olhos mais profundos sabem a resposta, sem nem mesmo questionar, e amam, porque está a seu alcance a percepção da alma sem máscaras, e pode mesmo ensinar a querer o que deve ser querido: isto é Misericórdia.
Rita de Cássia Antunes de Oliveira
Psicoterapia Existencial


(011) 91763293
skype:projetovemser
msn: rita_123_261@hotmail.com
www.projetovemser.com.br
follow me: @projetovemser

Nenhum comentário:

Postar um comentário