segunda-feira, 17 de maio de 2021

Um doce acalanto para nossa alma cansada, nosso interior, nosso coração...

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dorme, meu amor, que o mundo já viu morrer mais
este dia e eu estou aqui, de guarda aos pesadelos.
Fecha os olhos agora e sossega — o pior já passou
há muito tempo; e o vento amaciou; e a minha mão
desvia os passos do medo. Dorme, meu amor —
a morte está deitada sob o lençol da terra onde nasceste
e pode levantar-se como um pássaro assim que
adormeceres. Mas nada temas: as suas asas de sombra
não hão-de derrubar-me — eu já morri muitas vezes
e é ainda da vida que tenho mais medo. Fecha os olhos
agora e sossega — a porta está trancada; e os fantasmas
da casa que o jardim devorou andam perdidos
nas brumas que lancei ao caminho. Por isso, dorme,
meu amor, larga a tristeza à porta do meu corpo e
nada temas: eu já ouvi o silêncio, já vi a escuridão, já
olhei a morte debruçada nos espelhos e estou aqui,
de guarda aos pesadelos — a noite é um poema
que conheço de cor e vou cantar-to até adormeceres.
 
Maria do Rosário Pedreira, em «O Canto do Vento dos Ciprestes»
 
Arte - Catherine Yastrebova - Compartilhado da página Sonhar a realidade

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